quarta-feira, 22 de janeiro de 2014

Vem cá, Luiza


 
Mais do que uma torcida viral pró-Dilma em meio ao tiroteio do pessimismo econômico, o que revela todo este bafafá em torno da entrevista da dona do Magazine Luiza para o programa Manhattan Connection é o grau a que chegou o mau jornalismo entre nós. É como aquele filme "O Informante", que parecia estar o tempo todo falando sobre as suspeitas engrenagens da indústria do cigarro quando, na verdade, era muito mais um libelo contra os pecados de  certo tipo de telejornalismo norte-americano. A corajosa simplicidade com que a empresária Luiza Helena Trajano contestou ponto a ponto o manjado derrotismo blasé de Diogo Mainardi escancarou, em 15 minutos de um programa que, embora já tradicional de tão antigo, passa a quilômetros dos olhos do público médio brasileiro, o quanto precisamos oxigenar nossos noticiários. Que isso tenha acontecido num programa que, embora jornalístico, não é exatamente uma atração de conteúdo diretamente noticioso é apenas um sintoma a mais dessa mesma doença. 

Dito diretamente: a cada vez que Luiza rebatia com números, vigor e convicção - e nenhuma ideologia - as falsas verdades cristalizadas que quase todos os comentaristas do programa brandiam ela trazia um frescor informativo que anda fazendo muita, mas muita falta mesmo nos programas de televisão, nos jornais impressos, nas revistas semanais, nos portais de internet. Chegamos a tal ponto de consagrar, apressada e atabalhoadamente, realidades construídas em aquários de redação, completamente imunes a qualquer vírus da realidade lá fora, que quando se dá espaço a alguém para dizer algo que vá minimamente contra a corrente o resultado é este que estamos vendo no "meme" da Luiza. 

Luiza, pois, é menos uma novidade do que um sintoma. Há milhares de varejistas pensando exatamente o mesmo que ela em vários e vários pontos do país. Digo mais, há comerciários que dividem com ela as mesmas opiniões: cito o exemplo de um rapaz, caixa das lojas Rener no Natal Shopping, da capital potiguar, que disse a Rejane agora em dezembro mais ou menos o que a empresária afirmou no programa da Globonews. O garoto, de vinte e poucos anos, reclamou das pessoas que caem na conversa do Jornal Nacional e ficam com medo de usar o dinheiro que ganham, pensando que a economia do país está mesmo ladeira abaixo - e note que a questão aqui não é exatamente se isso está acontecendo de fato, em maior ou menor medida ou velocidade, mas a maneira como as pessoas se comportam diante do noticiário que praticamente comemora a derrocada que ela mesma anuncia.

É péssimo para a sociedade inteira essa falta de oxigenação, esse paredão de má informação construída, esse jornalismo que considera o "outro lado" uma questão meramente reflexiva  - e não algo que pode, mais do que equilibrar, devolver uma falsa notícia ao lugar de onde ela nunca deveria ter saído (o aquário da redação e toda a área em torno onde seus efeitos se multiplicam com burra automação). O caso Luiza mostra o quanto estamos perdendo em trazer para a página do jornal, a matéria da televisão, o colorido falso da revista uma visão menos monocromática não só da economia brasileira, mas de tudo o que se refere ao país. Pense na Copa, pense na cultura. Tem muita gente que pensa diferente mas não é fonte. Talvez porque, como já cansei de ouvir tantas vezes nas redações onde trabalhei, não "falam bem". A propósito, a empresária Luiza frequentemente sapeca um "os atendimento", ou uma situação "compricada", como você pode ver no video da entrevista. 

Ok, mas segure aí seu preconceito linguístico e pense no quanto você ouve de palavras vazias de entrevistados pra lá de cultos no telejornalismo brasileiro. E o que é melhor: Luiza, além de ser aquele caso de alguém que diz o que pode ser correto mesmo usando um português errado, ainda tem a maior estampa de cabocla, aquela aparência miscigenada que caracteriza o povão brasileiro mesmo que a um trilhão de quilômetros. Soa coerente que tenha sido alguém assim a pessoa a enfrentar a turma harvardiana do Manhatan Conection.

terça-feira, 2 de abril de 2013

A NOVA SENZALA (TRANSVERSALIDADES)

O texto abaixo é dirigido a quem acha que o máximo em termos de provocação (e reflexão sem ataduras) em vigor no país ainda é a coluna de Seu Caetano Veloso no caderno 2 do jornal O Globo. (e ainda atira umas pedras que são tiro-e-queda no estilão blasé-conceitual  da revista Piauí. reparem)


Por Marcelo Mirisola, no site Congresso em Foco


Não foi uma, nem duas, nem meia dúzia de vezes que tentei publicar um artigo na segunda página da Folha, na seção Tendências/Debates. Jamais consegui. Fiquei especialmente contrariado com duas recusas. O primeiro texto, “Boilesen ontem, hoje e sempre”, trata, como todo mundo está careca de saber, da Operação Oban. No segundo texto, “Setubão no forévis”, discorro sobre a morte de Olávo Setúbal, que foi banqueiro desde sempre e prefeito biônico da cidade de São Paulo, indicado por Paulo Egydio Martins num dos períodos mais turbulentos da ditadura militar (1975-79). Não me interessa, agora, divagar sobre esses textos. Vale que, no final das contas, os publiquei aqui no  Congresso em Foco. Nenhuma vírgula foi censurada. Só tenho a agradecer a Sylvio Costa, editor deste site.
Pois bem, não é de hoje que me chama a atenção a presença constante de dona Maria Alice Setúbal na seção Tendências/Debates, o filé mignon da Folha de S. Paulo. Dona Maria Alice, como indica o nome, é herdeira de Olavo Setúbal, e provavelmente deve ser acionista do banco Itaú. Nos créditos de seus artigos, consta que é doutora em Psicologia e presidente dos conselhos do Centro de Estudos e Pesquisas em Educação, Cultura e Ação Comunitária da Fundação Tide Setúbal. Seus artigos são redundantes. Ela gosta de usar a palavra “transversalidade”.

Não faz muito tempo que os Setúbal se uniram aos Moreira Salles, hoje, os negócios das duas famílias se ramificam em vários segmentos “comunitários” e “culturais”, Waltinho Salles é o mais notório sintoma, digo, o mais notório representante da aliança entre os Salles e os Setúbal. Quem viu Diários de motocicleta poderia jurar que o diretor  é um revolucionário que, no lugar nas armas, teria optado pelo lirismo para combater o monstro das injustiças e do capitalismo. Mas é sempre bom lembrar que tanto ele como dona Maria Alice são – antes de qualquer coisa – banqueiros.

O Instituto Moreira Salles é um exemplo impecável de cuidado com o patrimônio artístico brasileiro. Só para se ter uma pequena ideia, o acervo do IMS reúne cerca de 550 mil fotografias, 100 mil músicas, uma biblioteca com 400 mil itens e uma pinacoteca com mais de 3 mil obras. As partituras, os arranjos, os suores e piolhos, tudo de Pixinguinha, inclusive a alma, está lá. As obras de Millôr, Vinicius de Moraes, Décio de Almeida Prado, entre dezenas de músicos, artistas plásticos e escritores, constam do espólio Moreira Salles. Aqui, eu me pergunto:  esse tesouro foi comprado ou doado? Caso a primeira opção seja verdadeira, seria correto dizer que as almas desses artistas – embora estejam abertas a visitação – são de propriedade dos Moreira Salles? Tudo estaria perdido se não fosse a benevolência dos Salles? O que o Estado brasileiro tem a dizer a respeito? E das calcinhas do Wando, quem é que cuida?

O império cultural dos banqueiros abarca, além do IML, digo, IMS, a folha de pagamento das mais ilustres mentes do país (estes – ainda – não morreram), e contabiliza, além da revista de ensaios Serrote, a revista Piauí, cujo editor-chefe é Joaozinho Salles, irmão de Waltinho. Às vezes, é curioso notar que a Piauí deixa escapar um certo ranço da praça Vilaboim, sobretudo na “publicidade inteligente” que vende antes das sessões de cinema, cujas salas de exibição são deles mesmos. Pois os irmãos Salles têm o domínio, digamos assim, de toda cadeia produtiva: desde os sets de filmagem até a pipoca antes, durante e depois dos Dogvilles aos quais somos pleonasticamente (e sem vaselina) incluídos. Existe – reparem – uma inércia materna (ou imanência…) que paira sobre os caixas eletrônicos e os cines-Itaú . A gente se ferra e acha que banco é cinema. Do que eu falava? Ah, sim de dona Maria Alice. Já volto à dona Maria Alice, agora vou falar um pouco da revista Piauí.
Ah, como eu queria escrever na Piauí! Uma revista que disfarça a afetação como quem não quer exatamente disfarçar a afetação que, afinal de contas, é sinônimo de qualidade e marca registrada da Pça. Villaboim, sabem aquele ricaço que não usa meia?  A revista dos Moreira Salles, além de forçar uma casualidade, cultiva um humor elegante na medida exata de um aparente descompromisso com a grossura e vulgaridade das demais publicações do ramo. Como se a Piauí, enfadada por natureza, proclamasse: “vejam só que lixo é a Bravo! … mais um produto  da linha de montagem da Abril, os bregas publicam Capricho e Veja, nós não: somos iguais mas somos diferentes”.

Piauí faz o tipo cínico elegante, avant-garde goiabada cascão, PT do PSDB,  mocassim sem meia. Mas não se enganem! Os publishers são banqueiros e esse descompromisso serve apenas para distrair os órfãos de uma direita envergonhada que sofre porque a calle 23 en El Vedado não  é uma travessa da Rua Maranhão (eu penso que isso é positivo, e  já enviei dois textos pra lá que foram recusados… será que dona Maria Alice também é colaboradora da Piauí?); e assim, resumidamente, numa barafunda de boas intenções e um inferno que está repleto de casualidades premeditadas, canelas nuas e um charme indisfarçável, guichês intransponíveis e juros estratosféricos, ficamos com a impressão de que a agiotagem é apenas um insignificante detalhe diante das inegáveis contribuições dos clãs Moreira Salles e Setúbal para a cultura brasileira.  Mas não é. Evidentemente não é. E eu digo isso porque sou correntista do banco Itaú, pago altos juros pra dona Maria Alice Setúbal e também sou leitor de suas intervenções na seção Tendências/ Debates da Folha de S. Paulo. Gostaria de acreditar que o jornal  ainda não foi absorvido pelo acervo do Instituto Moreira Salles.
Voltando à dona Maria Alice Setúbal.

O que madame teria de tão importante para acrescentar, tirante suas “transversalidades”, ao debate de ideias, ou, mais especificamente, por que as idéias dela são tão relevantes para desfilar na seção Tendências/ Debates da Folha?

Vou arriscar um diagnóstico.

Os textos de madame costumam ter a marca indelével que conduz do óbvio ao ululante, são como folders, propagandas de condomínio que indicam, ou melhor, cobram o caminho da felicidade, apesar de a felicidade, pobre e acuada felicidade, não ter sido consultada a respeito de tão nobre encaminhamento. Mas uma coisa dona Maria Alice sabe fazer, algo que circula em seu sangue de agiota, ela sabe cobrar.
No seu último artigo, “Novas formas de aprender e ensinar”, publicado no dia 27 de março, dona Maria Alice Setúbal aposta na “inteligência coletiva” que – segundo sua bola de cristal high-tech – está na iminência de ser consumada pela força da revolução tecnológica. Madame não costuma deixar lacunas porque cumpre sua função, repito, que é levar o nada a lugar nenhum com a marca da excelência, como se o mundo fosse uma agência bancária cor-de-laranja protegido por portas giratórias e slogans de publicidade.

Não obstante, dessa vez, madame deu uma vacilada.

Dona Maria Alice Setúbal esquece que o lado de fora não tem ar condicionado. Revolucionária, decreta o fim do ensino linear. Para madame, o ensino da maioria das escolas – que ainda trabalham com aulas expositivas e livros didáticos – não faz mais sentido diante do conhecimento que é “transversal e produzido nas conexões entre várias informações”. Bem, esses conhecimentos ou essas conexões, que eu saiba, só existem e funcionam em sua plenitude nos sistemas de cobrança do banco de madame e na bolsa de valores. No mínimo, dona Maria Alice Setúbal, que se imagina mensageira do futuro, é uma debochada. Convenhamos que a “realidade transversal” que os nossos professores experimentam nas salas de aula têm outros nomes que nem o eufemismo mais engenhoso poderia disfarçar, tais como humilhação, porradaria, salário de merda. Para coroar seu pensamento revolucionário, dona Maria Alice, sentencia: “Essa transversalidade se expressa nas demandas das empresas e nas expectativas dos jovens”.
Que jovens são esses?  Aqueles que madame adestra em seus canis cor-de-laranja?  Qual a expectativa deles?  Telefonar pras nossas casas às sete horas da manhã para nos lembrar que somos devedores do Itaú? Ou a expectativa desses jovens é subir na vida, e virar gerente de banco?

Dona Maria Alice vai além e se entrega, ela acredita que a tecnologia vai produzir “pessoas que saibam resolver problemas, comunicar-se claramente, trabalhar em equipe e de forma colaborativa. Que usem as tecnologias com desenvoltura para selecionar, sistematizar e criticar informações. E que sejam inovadoras e criativas”.

Ora, madame quer empregados que não a incomodem, e encerra seu raciocínio ou exige, de forma impositiva e castradora: “E que sejam inovadoras e criativas”.  Não querendo fazer leitura subliminar, nem ser Lacaniano de buteco, mas esse “E que sejam inovadoras e criativas” é de amargar, hein, madame?

O artigo de dona Maria Alice é uma ordem de comando. A voz da dona, a mulher que visivelmente não pode ser contrariada. Difícil ler e não sentir-se um empregadinho dela. Ao mesmo tempo em que ordena “inovação e criatividade”, elimina a possibilidade de reação: “para fazer da tecnologia uma aliada da educação, é preciso vencer o medo do novo e superar a cultura da queixa”. Como se madame dissesse: “Publiquem meu artigo genial, obedeçam, e calem a boca. O futuro é meu, e se eu disser que é coletivo e cor-de-laranja, dá na mesma”.

O pior é que os filmes do Waltinho Salles são feitos no mesmo diapasão. A mesma lógica, a diferença é que ele ordena lirismo. Eles são banqueiros!  Em vez de desfilarem seus preconceitos e visões de mundo revolucionárias nas páginas dos jornais, na “pedagogia”, nos cinemas, no mundo do entretenimento e nas artes em geral, essa gente faria muito mais pela sociedade e pela cultura se extinguisse suas financeiras e baixasse os juros pros pobres coitados de seus correntistas. Não desejo a fila da Taií pros meus coleguinhas escritores nem pros rappers que frequentam os saraus do Itaú cultural. Até a alma do Leminski ( “ocupação Leminski”) eles compraram.

Eu falava de madame (versão 2013) que diz que samba é coisa de gente elegante. Dessa vez a visita periódica que madame faz à sua cozinha, também conhecida como “Tendências/Debates”, ultrapassou o terror costumeiro, e, no lugar de marcar presença e autoridade, madame só fez azedar o cuscuz. Ela devia ser mais discreta, como Olavão, o patriarca, o banqueiro. Não se deve confiar demais na vassalagem (leia-se correntistas e leitores).

No mesmo dia que madame publicou seu artigo, aconteceu uma coincidência reveladora, logo acima do texto de sinhá, no “Painel do leitor”, uma dona de casa, Mara Chagas, reclamava enfurecida da nova lei das empregadas domésticas, e fazia coro – às avessas, mas coro – à mme. Setúbal: “As empregadas domésticas não trabalham aos sábados, não cumprem as oito horas diárias, o serviço tem que ser ensinado (não são mão de obra especializada), almoçam e lancham na casa dos patrões sem cobrança alguma e faltam sem avisar. Como ficará o empregador diante disso?”

Eis a questão.

Pelo menos dona Mara Chagas, a leitora, foi honesta e direta, e não precisou de “transversalidades” para exprimir suas ideias revolucionárias. E o melhor: ela não vai concorrer ao Oscar, e jamais vai se manifestar no “Tendências/ Debates”. Nem ela, nem eu.

segunda-feira, 11 de março de 2013

HUGO CHAVEZ SEM NHEM-NHEM-NHÉM

 
 
Isso sim é Hugo Chavez sem nhem-nhem-nhem. E este programa trouxe de volta à televisão brasileira (importante: à tv ABERTA, o que aumenta a importância deste fato) a boa entrevista, sem firula nem enfeite videoclipado que mascara a má qualidade da abordagem e a coragem no enfrentamento dos temas. Mesmo que você não goste do falecido, aprecie a qualidade do programa. Basta gostar de televisão.

quarta-feira, 17 de outubro de 2012

Fala, Zé!



De uma hora pra outra, todo mundo quer entrevistar o ator José de Abreu. Ótimo: pelo menos assim quebra-se, por um momento (e por obra da repercussão de seu Nilo, da novela Avenida Brasil), o falso silêncio em torno do pensamento político único que a imprensa em geral deseja implantar. Ouvir José de Abreu é abrir espaço para quem não decreta automaticamente que o outro José, o Dirceu, é a última encarnação do demônio na Terra, e abrir a cabeça para uma reflexão política que, tanto quanto cresce nas camadas menos acovardadas da população, mais é silenciada nas páginas dos jornais e blocos dos telejornais. Com vocês, um Zé na contramão (do site do jornal Folha de S. Paulo):


O MENSALÃO E O PT
 
"Eu nunca conversei com o Zé [José Dirceu] a respeito das denúncias. Acho que o PT fez o que sempre se fez. É errado? Sim! Mas fez o que sempre se fez". 

"Por que o PPS apoia o Serra em São Paulo e o Paes/Lula/Dilma no Rio? Qual o sentido disso? Roberto Freire [presidente do PPS] passa 24 horas por dia no Twitter metendo o pau no Lula, chamando de ladrão e de corrupto, e fecha com o Paes aqui, com um vice-candidato a prefeito do PT? É venda de espaço, venda de horário, venda da sigla. Vou ser processado. Já estou sendo processado pelo Gilmar Mendes [ministro do STF, por chamá-lo de corrupto no Twitter]]. Agora, talvez seja processado pelo Freire." --procurado pela reportagem, Roberto Freire declarou: "Esse ator tem uma ética política que orbitava ao redor do PCB [Partido Comunista Brasileiro]. Agora, ele não tem mais nada disso. Não merece meu respeito nem a minha resposta." 

"O Supremo quer mudar a maneira de fazer política no Brasil. Ótimo, maravilha! Óbvio que tinha que começar com o PT. Então, agora para ser condenado no Brasil basta ser preto, puta, pobre e petista." 

"O grande organizador da base foi o Zé Dirceu. Eu não tenho informação de cocheira para falar. Lendo a imprensa, deu para notar o seguinte. Antes do Lula ser eleito, houve uma reunião dele com o Zé Dirceu dizendo que ele não queria mais concorrer, né? E o Zé o convenceu com a ideia do José de Alencar [ex-vice-presidente] ser vice, de abrir um pouco mais o PT, de fazer coligação etc. Isso tudo foi o Dirceu quem fez não o Lula. Mas se for a história do domínio do fato, tem que prender o Fernando Henrique por comprar a eleição dele, porque tem provas. Agora se fala, eu sei que houve, mas não sei quem fez. O deputado Ronnie Von Santiago [que era do PFL-AC] falou eu ganhou R$ 200 mil para votar a favor da reeleição do Fernando Henrique. Ah, o FHC não sabia? Mas pelo domínio do fato, não saber é como saber. Então se pode enquadrar qualquer um, até o Lula, que sem dúvida nenhuma é o grande objetivo..." 

"O PT está virando o Brasil de cabeça para baixo, está colocando uma mulher na presidência, um negro na presidência do STF, tirando 40 milhões da pobreza, fazendo um cara que sai do Bolsa Família, do ProUni, fazer mestrado em Harvard, ter os primeiros lugares do Enem." 

"Como é que um operário sem dedo, semianalfabeto faz isso que nunca fizeram? O nosso querido Fernando Henrique Cardoso, que era a minha literatura de axila na faculdade, que era meu ídolo. Não o Lula. O Lula era da minha geração, o FHC de uma anterior. Fernando Henrique, Florestan Fernandes eram os caras que queria mudar o Brasil. Aí o Fernando Henrique tem a oportunidade e não faz? Vai para a direita? É uma coisa louca. O que aconteceu? O PT e o PSDB nasceram da mesma vértebra. Era para ser um partido só. O que acontece é que chegam ao poder e vendem a alma ao diabo. Fica igual ao que foi feito nos 500 anos. O PT teve o peito de tentar romper, rompeu e está pagando por isso." 

"Eu votei no Fernando Henrique na primeira vez [na eleição de 1993]. Achava que ele era melhor do que o Lula naquela oportunidade. E foi mesmo. O Lula foi melhor depois."

segunda-feira, 6 de agosto de 2012

As pesquisas, o mensalão e a "opinião pública"




Por Ricardo Kotscho

Nunca tantos falaram em nome da "opinião pública" como nestas últimas semanas que antecederam o início do julgamento do processo do mensalão pelo Supremo Tribunal Federal.

Até o ex-presidente Fernando Henrique Cardoso, em nome da "sociedade que não suporta mais esta situação", saiu dos seus cuidados para gravar vídeos clamando pela necessidade de se "fazer justiça" para não colocar em risco o futuro da democracia brasileira.

E só tem um jeito de se fazer justiça, segundo os porta-vozes midiáticos da opinião pública, repetindo com todas as letras o lema do procurador-geral Roberto Gurgel: "Fazer justiça é condenar todos os réus".

A "sociedade" a que FHC se refere deve ser certamente aquela formada por seu moribundo partido (ver pesquisa CNT Opinião e Ibope mais abaixo) com os principais veículos de comunicação do país reunidos no Instituto Millennium, que desde 2005 querem "acabar com esta raça", o desejo revelado publicamente por seu aliado Jorge Bornhausen (por onde andará?).

Antes mesmo de Roberto Gurgel começar a ler o seu memorial de acusação na sexta-feira, após o massacre contra o PT dos últimos dias, que ocupou todos os espaços na velha mídia, dia e noite, o veredicto já estava dado, e nem seria necessário prosseguir o julgamento. Bastaria chamar o camburão da polícia para prender todos os réus.

O objetivo declarado era condenar e tirar de circulação o ex-ministro José Dirceu e outros dirigentes do PT. Por trás de todo o discurso moralista em nome da "opinião pública", porém, o que eles queriam mesmo era finalmente derrotar e acabar com a alta e inabalável aprovação popular do ex-presidente Lula, o que não conseguiram fazer nas urnas.

Gastaram toda sua munição nisso e devem ter ficado profundamente frustrados quando foram divulgados ontem os resultados da pesquisa CNT Opinião, mostrando que Lula teria 69,8% dos votos se a eleição presidencial fosse hoje, contra apenas 11,9% do tucano Aécio Neves, o candidato de FHC. Dilma também ganharia de lavada de Aécio: 59% a 14,8%.

Na falta de uma pesquisa sobre como o povo entende o julgamento do mensalão e o papel da imprensa nesta história _ por que não a fizeram ainda? _ outro indicador que deve deixar a "sociedade" dos tucanos e da mídia inconformados é a avaliação da presidente Dilma Rousseff, que não para de subir: passou de 70,2%, em agosto de 2011, para 75,7% por cento agora.

Ou seja: nem o governo Dilma, nem Lula, nem o PT foram abalados pela campanha de vida ou morte desencadeada por derrotados de 2002, 2006 e 2010.

Pior ainda para o orgulho dos tucanos de bico grande em São Paulo deve ter sido a pesquisa Ibope também divulgada ontem sobre a sucessão municipal em São Paulo.

Outra vez candidato tucano, José Serra também não para de subir, mas é nos índices de rejeição, que já atingiram 34% nesta pesquisa (no Datafolha, chegaram a 37%).

Nos índices de intenção de votos, acontece exatamente o contrário: em relação à primeira pesquisa Ibope, divulgada em maio, Serra caiu 5 pontos, ficando agora com 26%, enquanto o candidato do PRB, Celso Russomanno, subia 9 pontos, de 16% para 25%, em rigoroso empate técnico com o tucano.

O que se nota nesta pesquisa é que Russomanno, e não o candidato do PT, Fernando Haddad, empacado com apenas 6%, atrás de Soninha, do PPS, incorporou o papel de candidato da oposição à administração Serra-Kassab.

O eleitorado parece cansado da eterna disputa entre tucanos e petistas e, ao que as pesquisas até aqui indicam, escolheu este ano uma terceira via, encarnada pelo candidato do PRB e sua bandeira da defesa do consumidor.

Na semana em que começou o julgamento destinado a "acabar com a raça" do PT, foi o PSDB de Serra que bateu seu recorde de rejeição no Ibope, enquanto Dilma e Lula batiam recordes de números positivos.

Alguma coisa deu errado no projeto dos estrategistas globais do Instituto Millennium. A "opinião pública" tão cortejada já não obedece aos antigos "formadores de opinião".

segunda-feira, 28 de maio de 2012

Veja e Gilmar: história mal contada

Por Luciano Martins Costa, no Observatório da Imprensa:

A imprensa tradicional, ou os meios de comunicação vinculados às marcas tradicionais da imprensa, já não são capazes de mobilizar opiniões e vontades no Brasil. A afirmação, feita sem uma pesquisa que a respalde, pode parecer leviana à primeira vista, mas a cada semana se torna mais evidente que a opinião do público e a ação política dos cidadãos passam muito longe de instituições como a mídia ou os partidos.

A mera observação do noticiário permite constatar como certos temas ganham grande destaque no papel sem, no entanto, provocar o número proporcional de comentários de leitores em sua versão digital. No fim, tudo se transforma em um círculo de manifestações entre a imprensa e suas fontes, sob o olhar aparentemente desinteressado da sociedade.

A nova estocada da revista Veja, segundo a qual o ex-presidente Lula da Silva teria pressionado o ministro do Supremo Tribunal Federal Gilmar Mendes a adiar o julgamento do chamado caso “mensalão”, em troca de uma blindagem do ministro na CPI que investiga as atividades do bicheiro Carlos Cachoeira, é o caso que merece essa observação.

Aposta do Globo

Segundo a revista da Editora Abril, o ex-presidente teria feito “insinuações” sobre as relações entre Gilmar Mendes e o senador Demóstenes Torres, apontado como articulador dos interesses do bicheiro no Congresso e em alguns estados. A história comprada pela imprensa é de que Lula teria pressionado o ministro do STF para adiar o julgamento do caso “mensalão”.

O ex-ministro Nelson Jobim, que participou do encontro, ocorrido no mês de abril em seu escritório de Brasília, afirma que a conversa não teve esse teor, mas a imprensa escolheu a versão de Gilmar Mendes e da revista Veja.

Pois bem. Nas versões eletrônicas do noticiário a respeito do assunto, disponíveis desde sábado (26/5) na internet, não acontece a repercussão que um episódio dessa gravidade deveria merecer. No domingo (27) , o assunto subiu entre os mais comentados no Twitter e ganhou alguma repercussão no Facebook, mas os leitores se dividem entre os que tomam partido sem qualquer questionamento, enquanto outros evidenciam o fato de que não pode haver duas verdades: ou o ministro Gilmar Mendes mentiu ao insinuar que foi chantageado pelo ex-presidente da República, ou mente o ex-ministro Nelson Jobim, que diz não ter havido a conversa nos termos citados por Mendes.

A imprensa, em peso, tende a acreditar na versão de Gilmar Mendes, e entre os jornais aquele que aposta mais fichas na veracidade da denúncia veiculada por Veja é o jornal O Globo (ver “Lula e Gilmar Mendes: conversa errada, no local errado, com pessoa errada”). Mas esse aval serve apenas para estimular mais especulações e dar voz a deputados e senadores que tentam descaracterizar a Comissão Parlamentar de Inquérito que investiga a quadrilha montada pelo bicheiro Cachoeira no Congresso Nacional em sociedade com o senador Demóstenes Torres.

A imprensa toma partido

A história serve a Gilmar Mendes como antídoto para especulações sobre seu relacionamento com o senador Demóstenes Torres. Para outros envolvidos em maior ou menor grau com o bicheiro, serve para lançar dúvidas sobre o processo em curso.

O leitor de jornais pode perceber claramente que duas versões se chocam no noticiário. A versão da revista Veja, comprada pelos grandes jornais de circulação nacional, diz que o ex-presidente da República tenta usar o caso Cachoeira para evitar condenações no caso “mensalão”. Outra versão, apresentada por representantes do partido governista e veiculada em blogs e outros meios alternativos, levanta a hipótese de que o chamado “mensalão” tenha sido criado e amplificado a partir de um acordo entre o bicheiro Carlos Cachoeira e a revista Veja.

Cada jornal pode tirar suas conclusões, mesmo porque nem tudo que chega às redações vira notícia – parte dos fatos é usada para fundamentar internamente as escolhas editoriais. O que foge à lisura do processo jornalístico é a omissão da imprensa em geral quanto ao fato de que a revista Veja não tem isenção para se manifestar sobre o caso Demóstenes-Cachoeira, uma vez que a publicação da Editora Abril aparece entre os principais interlocutores do bicheiro nas gravações em poder da Polícia Federal.

Apenas a revista CartaCapital se refere a esse fato e lembra as relações entre Veja, Demóstenes e Cachoeira, além de observar que a proximidade entre o ministro Gilmar Mendes e o senador acusado “é pública e notória”.

Interessante observar como a chamada grande imprensa passa ao largo de algumas evidências e despreza outras, conforme o viés que elas dão ao noticiário. Também é interessante constatar que, onde podem opinar – ou seja, nos meios eletrônicos –, os leitores parecem não dar a menor importância

quarta-feira, 28 de março de 2012

Tô voltando!


Lula informa sobre o fim do tratamento contra o câncer e avisa que está de volta ao palco das disputas políticas.